13 DE JULHO

(guina, 13 de julho de 1994)

Já era manhã quando ele se levantou e, antes de
chegar ao banheiro, abriu a janela do corredor para ver o
dia. A chuva caia, lembrando que, agora, já era inverno.
Tudo estava branco, cinza e molhado. Não se via o céu.
Só chuva.
— Que droga! – pensou fechando a janela de
vidro. Mas, ficou olhando a chuva escorrer pela janela...
estava chovendo muito forte e os trovões eram
ensudercedores e pareciam vir junto com os relâmpagos.
Olhou distante, no infinito. Já não via chuva,
nem tampouco chegava a ouvir os trovões. Estava com o
olhar distante, voava em pensamentos para um lugar mais
longe ainda, mas que ela sabia onde era aquele lugar...
porque fora ali que ele viveu a maior parte de sua vida.
— Papai! Papai! Você está bem? – Perguntou a
filha, olhando o pai paralisado frente à janela.
Ele suspirou. Pegou a criança nos braços e
abraçou-a forte. Seus olhos que já estavam inundados ,
se transformaram em chuva... sua saudade era muito
grande. Não só, pelas pessoas que amava; a mãe, os
irmãos e irmãs, os sobrinhos e os milhares de amigos
que havia deixado, mas também pelo lugar que sempre
lhe dera sol... e era tudo o que ele queria naquele
momento... sol.
As lembranças começaram a chegar mais nítidas,
e com mais freqüência.
E voltando ao passado, lembrou-se de alguém
muito especial, que sempre esteve em seu coração, mas
que, as responsabilidades, a esposa e a filha, roubaram-na
de seu pensar... mas que sempre parecia estar nalgum
lugar e nas mulheres que conhecia e que já tivera algum
relacionamento mais próximo.
Continuara a olhar a chuva. Sentia um vazio no
peito, ainda estava distante...
De repente, seus olhos pararam num só lugar, e
com uma das mãos, esfregou os olhos para tentar ver
novamente o que vira... ou o que pensara que estava
vendo. E ele estava a ver alguém, que jamais acreditara
poder ver novamente.
Seu coração disparou. Seus braços afogaram seu
abraço, enquanto seus olhos mantiam-se fixos na imagem
que parecia sumir em meio a tempestade.
Lentamente, a criança foi escorregando por entre
os seus braços, até chegar ao chão. Ele correu até a porta
da cozinha, porque ficava mais próxima da varanda, e
saiu correndo, na chuva, em direção daquele holograma...
e nada. Não encontrou nada do que tinha visto. Estava
louco. Parecia absurdo, mais ele estava ali, no meio
daquela chuva, todo ensopado e com frio...e apesar disso,
ele não conseguia acreditar.
— Não pode ter se escondido. – Lamentou.
Olhou por toda a sua volta, pelo jardim e nada...
O seu coração parecia querer soltar pela boca. E a chuva
escondia as lágrimas, e ele estava parado, como que
hipnotizado... olhando o nada.
— Papai! Papai! – Sua filha chamava, a alguns
metros de seu lado direito.
Voltando a si, ele virou o rosto para o lado, e viu
a sua filha no meio daquele temporal. Estava toda
molhada, apesar do guarda-chuva na mão, porém fechado,
por não ter conseguido abri-lo.
— Meu Deus! – Exclamou ao ver a sua filha
naquele estado. Seu suspiro ainda estava com
o pensamento e com suas lembranças, mas a sua ação fora
mais rápida.
E pegando a criança nos braços, chegou até a
varanda num piscar de olhos. Correu até ao telefone e
discou 102.
— Consulta a lista, um momento...
Olhando para trás, viu sua pequena parada no
centro da cozinha, tremendo de frio.
— Consulta à lista, bom d...
Ele desligou o telefone, e foi pegar uma toalha
para enxugá-la imediatamente.
— Perdão, meu amor. Acho que seu pai está
enlouquecendo.
— Por que?
Ele olhou-a sorrindo e disse: -- É uma longa
história minha querida, e eu gostaria de poder lhe contar,
mas eu preciso ter certeza de uma coisa. Eu preciso viajar
para rever alguém que imaginei ter visto... e nem sei ao
certo, se vou conseguir encontrá-la.
— É a mamãe , papai?
— Não minha filha, não é a mamãe. A sua mãe
foi embora assim que você nasceu, e...
— Foi para onde , papai?
— Olha filha, o Papai do céu quis que ela
viajasse para o céu, para ser uma estrela quando anoitecer...
E lá de cima, ela fica...
— Então, a mamãe é uma estrela?
— Eu não tenho certeza filha, mas como o seu
avô me dizia...
— E o vovô, também está lá no céu? – E ele é
uma estrela, papai?
— Acredito que sim! – Disse com um sorriso nos
lábios.
— Papai? – Indagou mais uma vez.
— Sim, filha?
— Quando ficar de noite, você me mostra que
estrela é a mamãe?
E sorrindo ele disse:
— Olha, vai ter tantas estrelas lá no céu, que eu
acho que não vou saber que estrela é a sua mãe, não. Mas
lembre-se sempre, que ela esta lá em cima olhando você,
tá? Agora vá lá no seu quarto, e vista uma roupa seca e
perfumada, tá?
— Qualquer uma, papai?
— Humm... Tá bom, hoje vai ser você quem vai
decidir que roupa colocar.
— Agora vá lá, que o papai vai telefonar!
— Consulta à lista, bom dia!
— bom dia! Por favor, gostaria de saber o telefone
de alguma agência de viagem...
— Pois não, que agência de viagem, senhor?
— Olha, eu não tenho nenhuma em mente, mas
se você puder me ajudar?
— É para fora do país, senhor?
— Não, não! – É vôo doméstico mesmo.
— Bom, então, vou dar ao senhor o telefone de
uma das empresa de aviação interna, se o senhor achar
melhor, claro.
Fim.

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